sábado, 5 de setembro de 2009

Dulce

Logo quero me adiantar, logo à frente há uma bela construção vermelha cor de terra. É um espaço cultural dedicado à memória de Uberdan Cardoso, um famoso ativista cultural da região. É André que me atende, um rapaz bonito com o sorriso sempre exposto, cujo valor de seu coração logo se percebe nos olhos. Apresenta-me todas as dependências do espaço sem ao menos julgar aquela figura estranha. Recebia-me – Maria – ternamente.
Seu Uberdan Cardoso ajudou a organizar durante muito tempo a famosa Via Sacra que acontece todos os anos em Planaltina. É um mega projeto teatral de rua, que mobiliza centenas de pessoas ao redor da encenação da paixão de Cristo. Cidadãos, pessoas comuns transformam-se em atores e a seriedade com que encaram este desafio, se vê nas muitas fotos expostas no espaço. É um professor da região que faz o Cristo atualmente. Uberdan também organizava festas temáticas na cidade.
Logo que entrei no espaço, André não estava só, estava em companhia da cativante Dulce, que passou um bom tempo calada, observando. Quando foi tentada a falar, encantou-me com a simpleza de sua sabedoria e bom humor.
“Olha André! Ela olha fundo nos olhos, parece que tá vendo tudo! São olhos de cura, você parece uma curandeira, sei lá!” – concluiu acertiva. Seguiu falando riquezas de forma despojada: “Tudo é manipulação de energia”; “Eu gosto de pássaro, mas não gosto de gato. O gato quer carinho, eu também, então, não dá certo. O passarinho só canta, é livre.”
Acaricia seus ouvidos, né, Dulce? – Ela se escondia da câmera para não ser filmada porque afirmava que estava muito feia. Disse-lhe:
“A feiúra nasce na alma. Você não é feia, Dulce. Seu bom humor descarrega qualquer ambiente.” – Leveza e força naqueles olhos crédulos, lúdicos, bem vindos. Por dentro, torcia para que o cinegrafista estivesse ao menos gravando o ritmo e o conteúdo de sua fala.

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